Friday, December 09, 2005

farewell and goodnight



este blog começou com um aviso de que minhas aventuras virtuais são, por definição, efêmeras. o metafrasta, de fato, é a mais longeva de todas e também a que me custou mais tempo e esmero. tentei sempre postar aqui textos que gostaria de ver publicados em lugares menos, digamos, fúteis. acontece que minha produção textual sempre foi esparsa - talvez por já trabalhar diariamente com textos e ter pouca disposição para me dedicar com mais afinco aos meus próprios, talvez por mera falta de disciplina - e não soube me adequar à voracidade dos blogs, esses tamagochis eternamente famintos. em outras palavras, perdi o tesão. tenho uma relação muito peculiar com a escrita e a produção em ritmo industrial não funciona para mim. se decidisse continuar com o metafrasta, os textos iriam gradativamente cair de qualidade, e não faria sentido mantê-lo desta forma.

agradeço às almas que acompanharam este modesto blog com tanto interesse, deixando comentários pertinentes e engraçados. agradeço também os comentários idiotas, por sinal. é claro que continuarei visitando seus respectivos blogs e deixando comentários oportunamente. obrigado e até a próxima.

Tuesday, November 08, 2005

paris calling

a frança arde. em um país que sempre nos foi vendido como exemplo de glamour, sofisticação e riqueza ouve-se nas rádios gritos de "a banlieue (perifeira) é a frança". são onze dias de revolta popular, e o saldo é de 4.700 carros incendiados, 1.200 pessoas presas e 3 mortos, além da instauração de um toque de recolher, legitimado pelo primeiro-ministro villepin.

além das informações acima, leio no jornal que a revolta se espalha por bruxelas e berlim. o mesmo jornal diz que este é um "toque de recolher contra a violência" e que a europa está "assustada". ora, por que só se fala de violência quando os pobres queimam carros? não é "violência" segregar imigrantes vindos de países igualmente violentados pela europa nos tempos - tão recentes - da colonização? estes mesmos imigrantes já não estão, há anos, "assustados"? não vivem num estado de medo constante? medo do desemprego, da discriminação, de serem linchados por usarem roupas islâmicas e por professarem seus credos?

quando as camadas mais pobres são levadas a um estado de degradação humana pela estrutura, elas não vêem outra saída senão se rebelar contra a mesma estrutura que as oprimiu. esta rebelião só pode se dar através da instauração do caos, da desobediência civil, da ruptura com as leis de conduta promulgadas pelo estado. se o estado se sente agora acuado diante do que denominam "selvageria" está somente sentindo o gosto tardio da selvageria institucionalizada a qual estas minorias que agora se revoltam foram submetidas.

em vários lugares do mundo, focos de rebelião eclodem e são acusados de extremistas. em entrevista ao jornal "o globo", tarek kawtari, porta-voz do movimento de imigração e da periferia na frança, responde à seguinte pergunta: "o senhor está de acordo com os métodos de queimar carros":

"estar ou não de acordo não é o problema. [esta] é uma manifestação de desespero. no fundo, são pessoas que querem mostrar que não se deve passar por cima da diginidade dos outros. há 30 anos governos sucessivos, de esquerda e direita, dizem que vão fazer algo. mas não há vontade real de mudar. agora, porque quatro ou cinco pessoas estão queimando carros vão criminalizar o problema. e é a criminalização que vai aparecer mais forte do que os problemas sociais e políticos."

falou quem está no bojo da questão. tarek termina a entrevista dizendo: "a resposta é nos organizarmos e sermos solidários entre nós. temos que ser mais fortes."

lembrando corisco: "mais fortes são os poderes do povo".

Tuesday, November 01, 2005

memorabilia

To fill a gap
Insert the Thing that caused it –
Block it up
With other – and ‘twill yawn the more –

Emily Dickinson

Foi por conta do sono da tarde que precisei trocar a camisa. Para me livrar do suor dos sonhos. Alcancei no armário a blusa antiga, daquelas que mal sabemos ainda existir. Eis que, por acidente, roço a mão sobre o peito esquerdo e ouço o inconfundível estalar de papel. Cavo no bolso e retiro um extrato bancário amarelento. 15 de dezembro de 2004. Há um ano, dois dias antes do meu aniversário, eu me encaminhei para o banco e imprimi um extrato. Um fato que já havia sido reduzido a uma não-lembrança traz à tona uma cornucópia de sons, toques e cheiros de que não me lembrava de que sentia falta. Um objeto sussurra no meu ouvido versos de amores perdidos. Seu hálito me lembra flores mortas.

Monday, October 31, 2005

de tecnocracias e bibliofilias



decididamente, não sou um homem normal. não gosto de carros, não quero ter um iate e nem uma cobertura na barra. tampouco quero andar com uma loura de propaganda de cerveja a tiracolo para causar inveja aos meus pares. não quero fazer mba e nem ser vice-presidente da mercedes-benz. não quero ganhar mais dinheiro do que preciso, e não preciso de muito dinheiro. tivesse a espiritualidade e a coragem necessárias, e não as tenho nem de perto, quereria a vida espartana dos santos. não tenho as ambições eleitas pelo deus-mercado e tão prontamente aceitas pelos idiotas da objetividade. ou minhas ambições são outras.

só posso achar que henry david thoreau foi mal interpretado quando disse que "os homens foram feitos para o sucesso, e não para o fracasso". dificilmente thoreau teria se referido ao "homem de ação", aquele que ama seu carro acima de todas as coisas, lê "valor", "isto é: dinheiro" e adjacências e poderia cantarolar, se cantarolar soubesse, e se tivesse a necessária autoconsciência, "no escritório em que trabalho e fico rico / quanto mais eu multiplico / diminui o meu amor." é claro que o filósofo também disse, "em vez de amor, dinheiro ou fama, dê-me a verdade." mas me parece que esta frase, se comparada à outra, é démodé.

sou um homem estranho porque meu trabalho não envolve multiplicar e dividir, não movimento capital especulativo com um telefonema, não faço economias entrarem em crise com uma frase de efeito. meu trabalho é lutar com as palavras e delas arrancar sentidos; é re-escrever o que foi dito; é, também, passar conhecimento adiante. ainda que ele careça de público, ainda que às vezes pareça palavras ao vento, pois este conhecimento não visa tornar sua vida doméstica mais fácil ou lhe entreter. porém, como disse recentemente ferreira gullar, "a maioria sempre pensou em se divertir; para refletir são poucos."

uma população constantemente entretida é uma população intelectualmente morta. a primeira definição de "entreter" no dicionário houaiss é "prender, desviar a atenção de; distrair". é isso: somos uma massa distraída, em busca de prazeres instantâneos que minimizem a dor, mas sem coragem, tino ou determinação para compreender esta mesma dor. e sabemos que não haverá nunca escassez de entretenimento para nos apaziguar.

constato que o que parece liberdade é cárcere, o que parece alegria é histeria. e a luta vã me espera pacientemente em qualquer esquina.

Sunday, October 23, 2005

arcade fire e wilco



já tive a oportunidade de ver algumas das minhas bandas e artistas favoritos ao vivo, mas foram poucas as vezes que assisti a um show que me deixasse de fato feliz. sim, feliz, alegre por estar vivo. o show do arcade fire ontem, dia 22 de outubro, no tim festival, conseguiu esta proeza.

fim de tarde, aguardo o amigo paulista andré z. p. e seus camaradas gente-boa osvaldo e luís no amarelinho, cinelândia. os três vieram de são paulo exclusivamente para verem o wilco, o arcade fire sendo, para eles, aperitivo. no meu caso era o contrário: o arcade era prato principal e o wilco, sobremesa. eles chegam e vamos para o douradinho tomar cerveja barata em vez de chope caro e morno no amarelo. algumas cervejas depois, como se aproximasse a hora do show, vamos para as imediações do mam para saideiras e para eu comer um cachorro-quente. alimentados e bebidos, rumamos para o museu às 22h:20; o show estava marcado para as 23h.

lá chegando, achamos a tenda lab e aguardamos (muito) o show da banda de abertura lado 2 estéreo. a dupla entrou no palco meia-noite, pedindo desculpas pelo atraso e justificando que eles não podiam entrar antes do fim do show da tenda jazz, pois o som vazava demais. simpático da parte deles. o show foi bacana, melhor do que eu esperava, e, como disse o andré, "nunca tinha visto ninguém percursionar o moog antes". só que ninguém tem paciência pra banda de abertura e estavam todos ávidos pelo arcade.

acabado o show do lado 2 estéreo, rumamos para o meio da platéia e esperamos a demorada montagem de palco. os roadies não paravam de trazer instrumentos: bumbo, acordeão, inúmeros violões e guitarras, cello, teclados, xilofone. também, pudera, a banda canadense possui sete integrantes e é famosa por sua, digamos, artilharia instrumental.

o arcade entra e ataca de vez com a epopéica "wake up", com seu coro de sete vozes reforçado pelo coro da platéia. o povo cantou verso a verso a letra, enlouquecendo com a habitual explosão de energia do septeto. um win butler impressionado com a receptividade da platéia emendou com seus cupinchas outros "sucessos" do disco "funeral" e do ep de estréia "us kids know" que fizeram a alegria dos indies presentes e deste que vos escreve: como "no cars go", "neighborhood #1: tunnels" e "neighborhood #2: laika", isso sem falar da versão esquisitona de "aquarela do brasil" em inglês (!), retirada, segundo butler, de "brazil: o filme", de terry gilliam. os integrantes do arcade fazem de tudo: pulam, correm, se esgoelam, revesam instrumentos e vocais, como na belíssima versão de "haiti", cantada meio em francês e meio em inglês por régine chassagne (esposa de win butler). merece destaque também o final apoteótico a cargo de "neighborhood 3#: power out" com direito ao xilofonista william butler (irmão do vocalista) não se restringindo a espancar o xilofone como também escalando a armação de ferro do palco para tocar nela (segundo o site de fãs do arcade, linkado no site oficial, will butler é responsável por tocar percussão, guitarra, baixo, pelos backing vocals e pelo "caos generalizado"). um show memorável, emocionante e que deixou toda a platéia em estado de graça.

em seguida, o wilco entrou no palco para dar continuidade à noite. não conheço bem a banda, ouvi somente o mais recente álbum, "a ghost is born", do qual tive uma boa impressão. o show a reforçou e, pelo jeito, foi um sonho realizado para os fãs: dois bis longos com direito ao vocalista jeff tweedy dizendo "a gente não vem muito aqui, então vai simplesmente continuar tocando" e a platéia se empolgando durante o que, suponho, sejam os hits do grupo.

enfim, dois shows excelentes por R$35, em boa companhia, numa noite de sábado. como diria fsx, "a vida não fica melhor do que isso".

Monday, October 17, 2005

you know i'm true

sim, eu poderia escrever sobre os cds do belchior que chegaram hoje aqui em casa. sobre a música "aguapé", em parceria com raimundo fagner, e que, em um disco medíocre, se comparado com os discos de começo de carreira do bigode, se destaca como um momento de puro lirismo e, por que não, genialidade.

poderia falar sobre "a montanha dos sete abutres" que passou domingo de madrugada na globo, me fazendo lembrar de outros filmes do billy wilder que vi pela primeira vez nas madrugadas de três rios, muito jovem, descobrindo pérolas como "se meu apartamento falasse" e "irma la dulce" (ah, shirley maclaine, antes de virar uma chata...).

poderia até falar sobre minha tentativa de sanar ignorâncias literárias, comprando desesperadamente "madame bovary" e "o vermelho e o negro"...

poderia falar sobre a cachaça que o máximo trouxe para mim do sul, "bento albino", deliciosa... ...ou sobre novos amigos geniais, como ivan "takeshi kitano" (nossa maior esperança em se tratando de um "escritor profissional") e marlon magno.

porém... porém...

...já é tarde da noite e não há nem mesmo cachorros latindo na rua. há um silêncio ancestral, somente quebrado pelo barulho perene do cooler do computador. há uma escuridão estranha de uma noite sem lua. há uma ciência terrível do meu próprio corpo. há o tempo das finas camadas de poeira que cobrem todas as superfícies deste quarto. e há memórias que gritam como harpias, como banshees. e há, acima de tudo, o medo certeiro de todos os amanhãs que ainda me aguardam.

Thursday, October 13, 2005

conversando literaturas, 11/10



driblando todas as intempéries possíveis e imagináveis, desde de chuva e greve, até garçons mau-humorados, o "conversando literaturas" conseguiu chegar ao fim do seu primeiro ciclo, sobre jack kerouac e seus companheiros geracionais. o último encontro se deu no recanto são domingos, após nosso grupo ter sido gentilmente convidado a se retirar do vestibular do chope.

os heróis que participaram desta última viagem ao mundo dos beats foram: o indefectível marlon magno, cuja profissão é escrever diariamente no blog continuo sendo ignorado sistematicamente; rômulo, o rei da mulherada; a contista camila lopes; o dublê de sociopata márcio; a nossa queridíssima adriana; o pequeno gênio do ciclo básico ivan "takeshi kitano"; jean daniel, que surpreendeu a todos com sua presença no último encontro!; isa laxe, defensora das artes plásticas contemporâneas; e otávio meloni, desenhista especializado em palhaços pós-modernos. além, é claro, deste que vos escreve e do helênico max, que, no dia 25/10, dará a partida no ciclo borges. agradeço imensamente a todos pela presença e pelo entusiasmo.

aviso aos participantes que as xerox do texto "a morte do autor", do barthes, gentilmente cedido pelo otávio e que serve como "leitura opcional" do encontro do dia 25, já estão comigo, quem quiser é só entrar em contato que a gente dá um jeito de entregar.

e, mais uma vez, para a crônica definitiva do encontro, visitem, é claro, o blog do marlon.
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